segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Pessoas que um leitor não compreende # 4

  • Quem diz que não lê porque "não tem tempo"

Antes de mais vejamos o seguinte: há uma diferença entre quem não tem tempo para ler e quem não lê porque não tem tempo. Porque é normal que o tempo se torne apertado, que as 24 horas se tornem escassas. Todos passamos por uma fase em que, seja por razões escolares, laborais ou familiares - e, até, festivas - damos por nós a descobrir que não conseguimos encontrar uns meros minutos para aquela "terapia" diária da leitura. É algo natural.
Da mesma maneira descobrimos que esgotamos tempo favorável para a leitura em tarefas que nos roubam minutos em frente a ecrãs. Quantos de nós não decidimos ir só "um bocadinho à Net" e dali a quatro horas submergimos para a vida real de olhos vermelhos, de entre blogs, e vídeos, e a hipnose do "scroll" no Facebook? Ou decidimos fazer zapping  de entre canais e canais de "trash TV" que conseguem manter-nos agarrados? Ou nos dedicamos aos jogos que guardámos no "tablet", que parecem tão recompensadores? Já nem falo das horas que passamos viciados em séries e filmes, claro. São a outra face da nossa "terapia". Portanto, há que saber ignorar o ecrã e escapar para um bom livro para aproveitar as horas vagas.

É por isso que me causa alguma estranheza ouvir alguém afirmar da maneira mais natural possível que "não lê", sendo a única razão para isso o "facto" de não ter tempo "para isso".
Como se o tempo dedicado à leitura fosse demasiado luxuoso para ser empregue em tal coisa. Como se fosse um passatempo fútil, típico de quem não tem nada para fazer da vida e que precisa de se ocupar. E perigoso, porque isso de ler pode "queimar neurónios" e dar ideias esquisitas à malta...


Querem ler? Leiam. Não se desculpem a mostrar os vossos relógios. Deixem as redes sociais, e o tablet, e o PC em paz, a não ser que leiam nessas plataformas; silenciem o diálogo interior que continuam a ouvir dos colegas e dos clientes lá do trabalho; livrem-se de tirar "selfies" com o livro - porque assim que as publicam vão dedicar-se ao ecrã, claro - e leiam. As crianças também precisam de atenção? Dêem-lhes atenção. E ensinem-nas a completar puzzles e a puxar pela imaginação enquanto brincam com carrinhos e bonequinhos - fora dos ecrãs! - e já agora, dêem-lhes livros. Ver os pais a ler por uns minutos não as vai deixar tristes, nem ensinar a ser anti-sociais, nem transformá-las em psicopatas controladores. Ou aproveitem para colocar a leitura em dia durante as sestas e a hora da caminha.
Não gostam de ler? Estão no vosso direito, mas sejam respeitadores que o Mundo agradece.

Digam-me, leitores/seguidores, quais são as vossas estratégias para encontrarem tempo para ler quando se sentem mais ocupados?

Boas leituras!
 

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

"As Claras Madrugadas", Amadeu Lopes Sabino


Em "As Claras Madrugadas", uma biografia ficcionada, o autor leva-nos a conhecer a vida de Michel Lidzki, o "pseudo-padrasto" do advogado belga Baudouin Dunesme. O livro presta quase uma homenagem, uma revisitação da vida de uma figura que poderia ter sido paternal, e, ao mesmo tempo, aborda o desenvolvimento político de Baudouin, enquanto contrapõe as ideologias de ambos. Ao mesmo tempo, o passado e o presente cruzam-se, enquanto o autor procede às investigações necessárias para descrever as vivências dos dois homens, o que também nos leva a pensar na forma como os locais se alteram em poucas décadas. 
O estilo de escrita é quase jornalístico e apesar das passagens mais "ficcionais", como o autor as explica, quando necessita de recorrer à imaginação, é bom sentirmos que estamos a ler "factos". E percebermos a mentalidade das pessoas ao longo das décadas referidas.
Conhecemos assim Michel, um "homem comum". Era judeu, nascido em Novogrudok, localidade hoje bielorrussa (mas no passado lituana e polaca), mas que a pouco se tornou um homem quase sem pátria e sem religião. Seguiu o sonho de ser dentista ao deixar a localidade natal e quando as forças de Hitler se alastram pela Europa conseguiu atravessar o Atlântico - com parte da ajuda do "nosso" Aristides de Sousa Mendes. Enquanto conhecemos a jornada de Michel percebemos que praticamente não se identifica como judeu. Bem pelo contrário, parece defender uma integração discreta na sociedade, sem especificar a religião (ou cultura?) que nem sequer pratica. Pretende ser apenas mais um homem, apesar do contexto que o rodeia. Por outro lado, o filho da companheira que vai encontrar em Bruxelas, Baudouin, é um revoltado durante a juventude, afiliado em forças políticas de esquerda, e movido pela vontade de fazer justiça contra o imperialismo, se necessário, até pelas armas, e chega a ingressar num campo de treino militar palestiniano. São dois inconformistas à sua maneira, pois se Michel, ao contrário do resto da família, se mostra aos outros indiferente aos rumos que o Mundo toma, o "enteado" parece ter tendência em "remar contra a maré".
"As Claras Madrugadas" - a luminosidade da paz? - promoveu-me uma leitura desafiante. Foca muitos aspectos políticos, e mantém presente muita terminologia da área, o que não tornou a leitura "leve", mas manteve-me bem atenta e cheguei ao fim com a sensação de que tinha acabado de ler algo com conteúdo, o que é compensador. O livro deixou-me a pensar em questões como a criação do Estado de Israel, um tema muitas vezes abordado ao longo da narração, pela forma polémica como os habitantes palestinianos foram afastados do território.
Sobre o livro, ainda tenho que partilhar convosco que gostei muitos das passagens em Portugal, durante a II Guerra Mundial, quando os refugiados chegavam ao nosso país para partir para outras paragens, e na época revolucionária do pós-25 de Abril, durante a organização de comunas. Mostrou-se uma boa forma de espreitar o ambiente que se vivia nesses tempos, através dos olhos de Michel e Boudouin.

Sinopse

E vocês, já leram este livro? Qual é a vossa opinião?
Boas leituras!

Nota:
"As Claras Madrugadas" foi o primeiro livro cedido pela parceira Editorial Bizâncio para análise. Tenho de agradecer, mais uma vez, a confiança depositada pela editora neste blog, e também a oportunidade que me providenciaram de ler este livro.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

"Propriedade", Valerie Martin


 
Sinopse

Este pequeno livro não chega a duzentas páginas, mas consegue ser marcante. É narrado pela protagonista, Manon, a mulher do dono de uma plantação de cana-de-açúcar no Louisiana de 1828. O facto de ser um livro centrado no tema da escravatura contado a partir da perspectiva de uma esclavagista foi o que o tornou tão interessante. Tal deixa o leitor "no olho da tempestade", a par de alguém que foi educado também numa plantação, que desde que nasceu é servido por escravos negros, que assume serem seres de natureza inferior e amoral sem nunca o questionar. Assim, damos por nós a acompanhar a acção a partir da sua forma de pensar, e deparamo-nos com diálogos sobre a venda e o preço de seres humanos como se assistíssemos a um diálogo natural entre vendedores de gado.
Não quero com isto comentar que Manon é uma personagem repulsiva, com quem antipatizamos facilmente. Ela é como é, porque era dessa maneira que a sociedade em que vivia se regulava e termos noção disso consegue dar-nos um murro no estômago.
A protagonista, no entanto, é uma mulher egoísta e infeliz. Vê o marido como um homem grosseiro, com quem mal consegue manter uma conversa ou mesmo qualquer contacto físico, até porque ele tem "o desplante" de manter como amante a própria escrava pessoal da esposa, Sarah. Para piorar a situação da protagonista, não gerou filhos dentro do casamento, mas na relação extra-conjugal, e Manon ainda se vê a braços com as críticas da própria mãe. Se há algo que deseja é ser independente, livre.
Assim, temos em braços duas mulheres que aspiram à liberdade. Porque não podemos esquecer que se os escravos são "propriedade" do dono, também à sua maneira a esposas o é, e mal tem direito a usufruir à sua própria "propriedade". No caso do falecimento de um parente, não ia logo a sua herança parar às mãos do marido, que muitas vezes a podia escoar rapidamente?
No livro, para além da história da protagonista, temos vislumbres sobre Sarah, contados numa espécie de "metatexto", porque a escrava não tem uma voz própria. É nas referências que Manon e outras personagens vão fazendo que percebemos qual é a vontade dela, o que também se torna interessante, porque da mesma forma que os "patrões" não compreendiam o que pensavam os seus "negros", também o leitor é mantido nessa perspectiva.
Achei "Propriedade" um bom retrato da sociedade do local na época e gostei muito da forma como está escrito. Valerie Martin consegue envolver o leitor na atmosfera do lugar apelando aos nossos cinco sentidos de forma que também ouvimos os passos pesados dos batedores nas escadas, e ainda nos presenteia com uma protagonista que nos deixa divididos. Não consegui deixar de sentir compaixão por ela, ao mesmo tempo que torcia por Sarah, por quem Manon fica obcecada.
Recomendo-o!

Já conheciam o livro? Qual é a vossa opinião?

Boas leituras!


 P.S.: Deixo uma pequena curiosidade sobre uma coincidência. Li este livro para completar a categoria de "romance de época" do nosso Desafio Inverso. Planeei ler para completar a segunda categoria, "livro passado no futuro", o "Órix e Crex", de Margaret Atwood. Bem, não é que numa nota final a Valentine Martin dedica este livro a Margaret Atwood? Fiquei atónita! São amigas, pelos vistos...
 

"Heart - Shaped Box"



Nirvana, "Heart - Shaped Box". Podia escrever que me sinto nostálgica, mas se na altura em que a banda tocava isto ao vivo eu ainda mal falava (quanto mais escrevia) como poderia dizer tal coisa?
Seja. 

Boa semana!


segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Parceria com a Editorial Bizâncio!

Hoje trago uma novidade fantástica: o Voyage iniciou uma parceria com a Editorial Bizâncio!
Não posso deixar de agradecer à editora por me ter depositado a sua confiança e ajudar este cantinho a dar outro passo. Vão poder contar com todo o meu apoio para a sua promoção.


Aproveitem para visitar o site da editora.

Boas leituras!